Os astrónomos descobriram um buraco negro supermassivo que pode ter sido lançado para fora do centro de uma galáxia distante pelo incrível poder de ondas gravitacionais.

Embora tenha havido vários outros casos suspeitos de buracos negros lançados de forma similar, até agora nenhum foi confirmado. Os astrónomos pensam que este objeto, detetado pelo Telescópio Espacial Hubble, representa um caso provável muito forte. Com uma massa de mais de mil milhões de sóis, este buraco negro será o mais massivo a ter sido expulso da sua localização original.

Os investigadores estimam que terá sido necessária uma energia equivalente de 100 milhões de supernovas em simultâneo para afastar o buraco negro do centro da galáxia. A explicação mais plausível para tal energia de propulsão é o objeto monstruoso ter sido chutado por ondas gravitacionais desencadeadas pela fusão de dois grandes buracos negros no centro da galáxia hospedeira.

A galáxia 3C 186.
A galáxia 3C 186, localizada a cerca de 8 mil milhões de anos-luz da Terra, é provavelmente o resultado de uma fusão de duas galáxias. A ideia apoia-se nas caudas de maré em forma de arco identificadas pelos cientistas e que geralmente são produzidas pela interação gravitacional entre duas galáxias que colidem. A fusão das galáxias também levou à fusão dos dois buracos negros centrais, e o buraco negro resultante terá sido expulso do centro da galáxia hospedeira por ondas gravitacionais resultantes da fusão. Créditos: NASA, ESA, and M. Chiaberge (STScI/ESA).

Previstas por Albert Einstein, as ondas gravitacionais são deformações no espaço-tempo que se propagam como ondas e que são criadas quando dois objetos de grande massa colidem. As ondulações são semelhantes aos círculos concêntricos que se geram quando uma pedra é atirada a um lago. No ano passado, o LIGO (Laser Interferometer Gravitational-Wave Observatory) ajudou os astrónomos a provar que as ondas gravitacionais existem, detetando-as num evento de fusão de dois buracos negros de massa estelar que possuíam várias vezes mais massa que o Sol.

As observações de Hubble sobre este buraco negro rebelde surpreenderam a equipa de investigação. “Pensei logo que estávamos a ver algo muito peculiar,” disse o líder da equipa, Marco Chiaberge, do STScI (Space Telescope Science Institute) e da Universidade Johns Hopkins, em Baltimore, Maryland. “Quando combinámos as observações do Hubble, do Observatório Chandra de Raios-X e do Sloan Digital Sky Survey, todas apontavam para o mesmo cenário. A quantidade de dados recolhidos, desde raios-X, ultravioleta, até ao infravermelho próximo é definitivamente maior do que para qualquer outro candidato a buraco negro rebelde.”

As imagens de Hubble, captadas no visível e no infravermelho-próximo, forneceram o primeiro sinal de que a galáxia era fora do comum. As imagens revelaram um quasar brilhante (a assinatura de um buraco negro) a residir longe do núcleo galáctico. Os buracos negros não podem ser observados diretamente, mas são a fonte de energia no coração dos quasares – feixes intensos e compactos da radiação que podem ofuscar uma galáxia inteira. O quasar, que tem o nome de 3C 186, e a sua galáxia hospedeira residem a 8 mil milhões de anos-luz de distância, num enxame de galáxias. A equipa descobriu as peculiares características da galáxia quando estava a conduzir com o Hubble um levantamento de galáxias distantes a desencadear poderosas explosões de radiação em eventos de fusão.

“Prevendo que ia observar um grande número de galáxias em fusão, eu esperava ver galáxias hospedeiras com formas alteradas em torno de quasares, mas não estava à espera de ver um quasar claramente deslocado do núcleo de uma galáxia com forma regular,” disse Chiaberge, acrescentando: “os buracos negros residem no centro das galáxias, por isso não é nada comum vermos um quasar fora do centro.”

A equipa calculou a distância do buraco negro ao núcleo galáctico comparando, a partir de um modelo de computador, a distribuição da luz das estrelas na galáxia hospedeira com a de uma galáxia elíptica normal. O buraco negro viajou mais de 35 mil anos-luz a partir do centro, que é uma distância superior à que existe entre o Sol e o centro da Via Láctea.

Com base em observações espectroscópicas feitas pelo Hubble e pelo Sloan, os investigadores estimaram a massa do buraco negro e mediram a velocidade do gás preso perto do objeto gigante. A espectroscopia divide a luz nas suas componentes, que podem ser usadas para medir velocidades no espaço. “Para nossa surpresa, descobrimos que o gás em torno do buraco negro estava a afastar-se do centro da galáxia a 7,5 milhões de quilómetros por hora,” disse Justin Ely, do STScI, membro da equipa. Esta medida é também um indicador da velocidade do buraco negro, porque o gás está gravitacionalmente ligado ao gigantesco objeto.

Os astrónomos calcularam que o buraco negro se move tão depressa que viajaria da Terra à Lua em três minutos. Esta velocidade é suficiente para o buraco negro se escapar da galáxia em 20 milhões de anos.

A imagem do Hubble revelou uma pista interessante que ajudou a explicar a localização do buraco negro. A galáxia hospedeira revela características ténues em forma de arco, as chamadas caudas de maré, produzidas pela interação gravitacional entre duas galáxias em colisão. Esta característica sugere uma possível união entre o sistema 3C 186 e outra galáxia, ambas com buracos negros centrais massivos que podem eventualmente ter-se fundido.

Com base nesta prova visível e com a ajuda da teoria, os investigadores desenvolveram um cenário que descreve de que modo o buraco negro gigante pode ter sido expulso do centro. Segundo a teoria, se duas galáxias se fundem, os seus buracos negros instalam-se no centro da nova galáxia elíptica que se forma. Como os buracos negros giram em torno um do outro, dão origem a ondas gravitacionais que se propagam de um modo semelhante ao da água num sistema de rega giratório. Os objetos pesados ​​vão-se aproximando um do outro ao longo do tempo enquanto espalham energia gravitacional. Se os dois buracos negros não têm a mesma massa e a mesma taxa de rotação, emitem ondas gravitacionais com mais intensidade ao longo de uma determinada direção. Quando colidem, deixam de produzir ondas gravitacionais. O buraco negro resultante da colisão recua então na direção oposta à das ondas gravitacionais mais fortes e sai disparado como um foguete.

Ondas gravitacionais lançando um buraco negro para fora do centro da galáxia.
Ilustração que mostra como as ondas gravitacionais podem lançar um buraco negro para fora do centro de uma galáxia. Créditos: NASA/ESA/A. Feild (STScI).

Os investigadores tiveram a sorte de apanhar este evento único porque nem todas as fusões de buracos negros produzem ondas gravitacionais desequilibradas que façam o buraco resultante sair disparado na direção oposta. “Esta assimetria depende de propriedades como a massa e a orientação relativa dos eixos de rotação dos buracos negros antes da fusão,” disse Colin Norman, do STScI e da Universidade Johns Hopkins, membro da equipa. “É por isso que estes objetos são tão raros.”

Uma explicação alternativa, embora pouco provável, para o quasar desalinhado propõe que o objeto brilhante não reside na galáxia, mas que está localizado atrás dela, embora a imagem do Hubble dê a ilusão de que ele está à mesma distância da galáxia. Se fosse esse o caso, os investigadores deveriam ter detetado uma galáxia de fundo a hospedar o quasar.

Se a interpretação dos investigadores estiver correta, as observações fornecem fortes provas de que os buracos negros supermassivos se podem mesmo fundir. Os astrónomos têm provas de colisões de buracos negros de massa estelar, mas o processo que regula os buracos negros supermassivos é mais complexo e não está ainda totalmente compreendido.

A equipa espera usar novamente o Hubble, em combinação com o ALMA (Atacama Large Millimeter/submillimeter Array) e outros meios, para medir com mais precisão a velocidade do buraco negro e do seu disco de gás, o que pode trazer mais informações sobre a natureza deste bizarro objeto.

O artigo de Chiaberge irá surgir na edição de 30 de março da Astronomy & Astrophysics.

Fonte da notícia: Hubble

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