Se no espaço não existe direção privilegiada e não sabemos o que é para baixo ou para cima, como podemos dizer que o eixo de rotação da Terra está inclinado?

Afinal, ele está inclinado em relação a quê exatamente?

Aqui na superfície da Terra, o sentido que definimos como “para baixo” é aquele que aponta para o centro do Planeta e o sentido oposto, vindo do centro da Terra, passando por nossos pés e apontando para o céu é o que chamamos de “para cima’.

Essa é uma orientação muito conveniente e fácil de determinar em qualquer ponto da superfície da Terra. A direção vertical é aquela seguida por um objeto em queda livre.

Acontece que nem todo objeto em queda livre descreve essa trajetória retilínea de “cima’ para “baixo”. Satélites também estão em queda livre, sujeitos apenas à aceleração da atração gravitacional terrestre, mas o resultado dessa aceleração é a mudança constante na direção do movimento do satélite, fazendo com que este contorne o planeta. É assim que a Lua se move em volta da Terra. A atração gravitacional muda constantemente a direção de seu movimento e a impede de escapar para sempre.

Um movimento dessa natureza, sob a influência de uma força central, permanecerá confinado em um só plano! E no caso do movimento da Terra sobre ação da força central da gravidade solar, a órbita fica confinada em um plano chamado eclíptica.

E toda a conversa até aqui foi para chegar nesse conceito: o plano eclíptica é o plano bem definido e constante que contém a órbita terrestre. E se esse plano é a referência que buscamos para comparar com a direção da orientação do eixo terrestre!

É em relação a esse plano que dizemos que o equador terrestre tem uma inclinação de 23.4º graus.

Representação da Terra em uma posição qualquer de seu movimento orbital
assinalando a inclinação de seu eixo de rotação em relação à normal à eclíptica (eixo de
translação).
Crédito: Ramachrisna Teixeira, Schwarza

Uma consequência dessa inclinação é que os hemisférios da Terra não são uniformemente iluminados durante todo o ano. E isso nos leva aos ciclos que conhecemos como Estações do Ano.

Para entender melhor vamos usar as imagens da câmera EPIC do satélite DSCOVR e . Escolhemos esse satélite porque ele observa a Terra a partir de uma posição privilegiada entre a Terra e do Sol, observando sempre a metade iluminada da Terra e fornecendo uma visão exata de qual hemisfério recebe mais luz em cada instante.

Ilustração fora de escala mostrando a posição do satélite DSCOVR, que se mantém entre a Terra e o Sol de modo a sempre observar o lado iluminado do planeta.
Crédito: NOAA

Olhando para a imagem abaixo, capturada em 21 de junho de 2020 pelo DISCOVR, vemos o Sol incidindo mais diretamente sobre o Hemisfério Norte, deixando-o mais iluminado que o Hemisfério Sul. E essa é exatamente a data que define o início do verão no Hemisfério Norte. E como, ao mesmo tempo, o Sul recebe menos luz solar é fácil deduzir que este seja o início do inverno no hemisfério oposto.

Terra em 21 de junho de 2020, fotografada pelo satélite DSCVR.
A linha tracejada representa a linha imaginária do Equador.
Crédito: NASA

E o que acontece seis meses depois? Vamos olhar a imagem abaixo para descobrir!
Como era de se esperar, agora vemos o Hemisfério Sul mais exposto e conseguimos inclusive ver o continente Antártico! Na Europa e na América do Norte, os raios do Sol chegam à superfície tangencialmente enquanto a América do Sul, a África e a Oceania são banhadas intensamente pela luz solar.

Terra em 21 de dezembro de 2020, fotografada pelo satélite DSCVR.
A linha tracejada representa a linha imaginária do Equador.
Crédito: NASA

Não é difícil imaginar que entre esses dois extremos passaremos por uma configuração em que ambos os hemisférios sejam igualmente iluminados. Imagine uma projeção do equador terrestre na esfera celeste. Essa linha imaginária no céu recebe o nome de “equador celeste”. É quando o Sol está exatamente no equador celeste que ambos os hemisférios recebem a mesma quantidade de luz solar. Nestas datas ocorrem os equinócios, quando dia claro e noite possuem a mesma duração.

Imagem da Terra de hoje, 20 de março de 2021, feita pelo satélite GOES-16.
Equinócio de Março evidente com os dois hemisférios igualmente iluminados!

No dia 20 de março, o Sol cruza o equador indo do Sul para o Norte. É o equinócio vernal, o início da primavera no Hemisfério Norte e do Outono no Hemisfério Sul. Esta é uma importante efeméride astronômica! O ponto onde o Sol se encontra nesta data é a origem do sistema de coordenadas astronômicas, marcado pelo encontro dos planos do equador celeste e da eclíptica! E talvez com menos repercussão, mas também com grande importância, este 20 de março de 2021 é especial por um outro motivo! É a estreia do projeto Céu Profundo como colaborador do Portal do Astrónomo! É um grande privilégio e alegria para o nosso time, um grupo de três entusiastas da astronomia que unem a paixão da astronomia amadora ao rigor técnico da formação acadêmica na Física e na Biologia para divulgar e popularizar a observação e o amor pelo céu.

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