Os buracos negros são já suficientemente misteriosos. Mas com a ajuda do Telescópio Espacial Hubble, os astrónomos descobriram um inesperado disco de material a girar a grande velocidade em torno de um buraco negro supermassivo no coração da magnífica galáxia espiral NGC 3147, localizada a 130 milhões de anos-luz da Terra.

NGC 3147 e buraco negro central.
À esquerda a galáxia espiral NGC 3147, pelo Hubble. À direita, uma ilustração do buraco negro supermassivo que reside no núcleo da galáxia. A imagem do Hubble mostra os braços espirais da galáxia, repletos de jovens estrelas azuis, nebulosas rosadas e poeira. No entanto, no núcleo brilhante de NGC 3147 esconde-se um buraco negro monstruoso, pesando cerca de 250 milhões de sóis. As observações do buraco negro pelo Hubble demonstram duas teorias da relatividade de Einstein. O que se vê em torno do centro, em amarelo-avermelhado, é o brilho da luz do gás que gira, preso pela poderosa gravidade do buraco negro. O buraco negro está profundamente enterrado no seu campo gravitacional, como mostra a grelha verde que ilustra o espaço deformado. O campo gravitacional é tão forte que a luz está a lutar para sair, um princípio descrito na teoria da relatividade geral de Einstein. O material está a girar tão depressa à volta do buraco negro que fica mais brilhante quando se aproxima da Terra e menos brilhante quando afasta. Este efeito, conhecido por emissão relativista, foi previsto pela teoria da relatividade restrita de Einstein. NGC 3147 está localizada a 130 milhões de anos-luz, na constelação do Dragão. Créditos: Hubble Image: NASA, ESA, S. Bianchi (Università degli Studi Roma Tre University), A. Laor (Technion-Israel Institute of Technology), and M. Chiaberge (ESA, STScI, and JHU); illustration: NASA, ESA, and A. Feild and L. Hustak (STScI).

O mistério é que, com base nas teorias astronómicas atuais, o disco não deveria estar lá. No entanto, a presença inesperada de um disco tão próximo de um buraco negro oferece uma oportunidade única para testar as teorias da relatividade de Albert Einstein. A relatividade geral descreve a gravidade como curvatura do espaço e a relatividade restrita descreve a relação entre espaço e o tempo.

“Nunca vimos com tanta clareza os efeitos da relatividade geral e restrita em luz visível,” disse Marco Chiaberge, da Agência Espacial Europeia, do Instituto de Ciência do Telescópio Espacial e da Universidade Johns Hopkins, membro da equipa que conduziu o estudo do Hubble.

“Esta é uma intrigante espreitadela a um disco muito próximo de um buraco negro, tão próximo que as velocidades e a intensidade da atração gravitacional afetam a aparência dos fotões de luz,” acrescentou Stefano Bianchi, da Università degli Studi Roma Tre, em Roma, Itália, principal autor do estudo. “Não podemos compreender os dados, a menos que incluamos as teorias da relatividade”.

Em certos tipos de galáxias, como a NGC 3147, os buracos negros são considerados subnutridos, já não há matéria suficiente a ser capturada pela gravidade para os alimentar de forma regular. Assim, a névoa fina de material que sobre eles cai é inflada como um donut em vez de ser achatada num disco em forma de panqueca. Por isso, é muito intrigante que exista um disco fino a rodear o subnutrido buraco negro de NGC 3147, semelhante a discos muito mais poderosos descobertos em galáxias extremamente ativas com buracos negros bem alimentados e monstruosos.

“Pensávamos que este era o melhor candidato para confirmar que abaixo de certas luminosidades o disco de acreção já não existe,” explicou Ari Laor, do Instituto de Tecnologia Technion-Israel, em Haifa, Israel. “O que vimos foi algo completamente inesperado. Descobrimos gás em movimento revelando caraterísticas que só podemos explicar como sendo produzidas por material a girar num disco fino bem próximo do buraco negro.”

Os astrónomos selecionaram inicialmente esta galáxia para validar modelos aceites sobre galáxias ativas de baixa luminosidade – com buracos negros em dieta escassa de material. Os modelos preveem que se forma um disco de acreção quando grandes quantidades de gás são capturadas pela forte força gravitacional de um buraco negro. Ao cair no buraco, essa matéria emite muita luz, produzindo um feixe brilhante chamado quasar. Quando há menos material a ser atraído para dentro do disco, ele começa a quebrar-se, tornando-se mais fraco e mudando de estrutura.

“O tipo de disco que vemos é um quasar reduzido que não esperávamos existir,” disse Bianchi. “É o mesmo tipo de disco que vemos em objetos que são 1000 ou até 100000 vezes mais luminosos. As previsões dos atuais modelos da dinâmica de gás em galáxias ativas muito fracas falharam claramente.”

O disco de gás está tão profundamente inserido no intenso campo gravitacional do buraco negro que a sua luz é alterada, de acordo com as teorias da relatividade de Einstein, oferecendo aos astrónomos uma visão única dos processos dinâmicos próximos a um buraco negro.

O Hubble observou que o material do disco gira à volta do buraco negro a mais de 10% da velocidade da luz. A estas velocidades extremas, o gás parece ficar mais brilhante quando se aproxima da Terra, e menos brilhante quando se afasta (um efeito conhecido por emissão relativista). As observações do Hubble mostram também que o gás está de tal modo inserido no poço gravitacional que a luz está a lutar para se escapar e por isso parece alongada para comprimentos de onda mais vermelhos. O buraco negro tem a massa de cerca de 250 milhões de sóis.

Os investigadores usaram o STIS – Espectrógrafo de Imagem do Telescópio Espacial Hubble – para observar o turbilhão de matéria dentro do disco. Um espectrógrafo é uma ferramenta de diagnóstico que divide a luz de um objeto nos seus muitos comprimentos de onda para determinar a sua velocidade, temperatura e outras características com uma precisão muito elevada. Os astrónomos recorreram à resolução precisa do STIS para isolar a fraca luz da região do buraco negro e bloquear a poluição provocada pela luz das estrelas.

“Sem o Hubble, não poderíamos ter conseguido esta observação, já que a região do buraco negro tem baixa luminosidade,” disse Chiaberge. “A luminosidade das estrelas na galáxia ofusca qualquer coisa no núcleo. Observando a partir do solo, o brilho das estrelas seria dominante e impediria ver a emissão fraca do núcleo.”

A equipa espera usar o Hubble para procurar outros discos compactos em torno de buracos negros ténues em galáxias ativas semelhantes.

O trabalho da equipa foi publicado online na revista Monthly Notices of the Royal Astronomical Society.

Fonte da notícia: Hubble Site

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