Hoje em dia toda a gente sabe que os dinossauros desapareceram da face da Terra há cerca de 65 milhões de anos, devido ao impacto de um objecto de origem extra-terrestre na zona do Iucatão, aquela península no sudeste do México. E na comunidade científica ninguém tem dúvidas acerca disto. Correcto?

Então, por que carga de água se realizou, na última Assembleia Geral da EGU (European Geosciences Union) – em Viena, entre 23 e 28 de Abril passado, uma reunião com milhares de geocientistas da Europa e do mundo – um debate com o título “Impact was not the main cause of mass extinctions” (Os impactos não são a principal causa das extinções maciças)?

Bem, é que é isso mesmo: a comunidade científica não está de todo completamente convencida de que foi assim que as coisas se passaram. Diria mesmo que existem alguns irredutíveis adversários da ideia, e eles têm os seus argumentos. E, a julgar pelo resultado da sondagem de braço no ar realizada na sala que albergava várias centenas de geólogos, geofísicos, paleontólogos e outros especialistas, a opinião está bastante dividida.

Os intervenientes no debate foram quatro, dois a defender cada uma das posições antagónicas. Cada um deles teve oportunidade de apresentar a sua visão sobre a questão, e depois responder a perguntas postas pelo público.

Foi apontado o facto de que as grandes erupções vulcânicas que deram origem aos “traps” (não, não são armadilhas; trap é uma palavra de origem escandinava, que significa degrau, uma alusão ao aspecto visual destas espessas sequências basálticas empilhadas umas sobre as outras) do Decão, na Índia, terem tido início cerca de 250 mil anos antes do fim do Cretácico. Este paroxismo vulcânico deve ter introduzido na atmosfera grandes quantidades de gases, e não pode ter deixado de provocar alterações ambientais, que se terão acumulado ao longo do tempo. A isto foi contraposto o facto de que existem provas de um impacto importante, com efeitos globais, no exacto ponto da coluna estratigráfica que marca o fim do Cretácico e a extinção dos dinossauros (e de outros grupos de seres vivos); e que esse impacto teve consequências imediatas, rápidas, radicais – essa extinção súbita é uma evidência.

No fim do debate, sem grande surpresa, as posições iniciais não se tinham alterado. Quem defende o vulcanismo como motor de extinções aponta para outras épocas de crise na história da vida e lembra que não são conhecidos impactos em todas elas; mas a questão é devolvida: onde estão as grandes erupções nessas épocas? E que efeitos teve a maior erupção conhecida em tempos (pré-)históricos, Toba (há 75000 anos)? Bom, nesse caso as opiniões dividem-se, mas é um facto que não provocou uma hecatombe de extinções – embora o volume envolvido seja muito menor do que a dos traps do Decão. E essa é uma questão importante: não se conhece ainda de forma segura a taxa eruptiva, isto é, o ritmo a que se sucederam as erupções nesta região da Índia nessa altura.

Em resumo, é esse o grande problema: não existem testemunhas… Tudo o que podemos fazer é tentar decifrar as pistas e indícios que ficaram nas rochas formadas nessa época. Observar, detectar, medir, e depois interpretar à luz das hipóteses formuladas: a ciência em acção. Alguma vez saberemos tudo? É pouco provável – mas não deixaremos por certo de tentar saber mais.

Neste caso em particular, talvez a verdade esteja numa junção das duas teorias; a Terra passava por um período difícil, com um paroxismo vulcânico como a Humanidade nunca testemunhou, e depois aconteceu o tremendo impacto de Chicxulub – talvez este fosse suficiente para provocar a extinção dos dinossauros, talvez o vulcanismo possa explicar outras extinções, nomeadamente no meio marinho. São muitos “talvez”, mas não se trata aqui de estabelecer uma lei física… Haverá sempre novos dados e novas ideias a poder ganhar adeptos, sem que isso signifique que correspondam à verdade final e absoluta.

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