O uso de simulações numéricas como base para previsão e sustentabilidade
❉ Este artigo faz parte de uma série de artigos preparados pelas oradoras do evento Soapbox Science Lisbon. A segunda edição do Soapbox Science Lisbon, para promover as mulheres na ciência, terá lugar no dia 23 de Outubro de 2021. Guardem esta data!
O uso de simulações numéricas como base para previsão e sustentabilidade
Por Rita F. Carvalho
Na minha participação no SoapBox vou falar sobre modelação numérica de escoamentos turbulentos, que são a maior parte dos escoamentos no âmbito da hidráulica e ambiente. Mostrarei alguns exemplos de escoamentos a que se dedica um engenheiro civil na área da hidráulica, como são estudados os escoamentos e o que é possível usar para os estudar com maior detalhe. Vou também dar a conhecer a investigação que está a ser feita na área da análise de dados e da multifísica; e finalmente mostrarei um procedimento que permite construir, a partir de imagens, malhas de cálculo necessárias para realizar as simulações numéricas e obter resultados. A ideia é mostrar que existem ferramentas disponíveis para estudar adequadamente os escoamentos, que devem ser usadas para prever situações, conhecer melhor os escoamentos e assim adequar os projetos e planos de manutenção de infraestruturas hidráulicas. Prever antes para melhor segurança e redução de custos. Gostava de salientar também que embora sejam mostradas aplicações relativas à engenharia civil, tudo isto é pluridisciplinar pois existem muitos outros fluidos e movimentos que são de interesse de outras áreas.
❉
O meio ambiente, o património e as infraestruturas existentes na sociedade atual, cujo projeto, manutenção e defesa costumam estar a cargo da engenharia civil e do ambiente, enfrentam atualmente diferentes ações e problemas (ver Fig. 1). As alterações climáticas são assumidas como cenário futuro, na escala de tempo que rege as preocupações atuais, com várias consequências nas estruturas hidráulicas. Espera-se um impacto na frequência de eventos extremos de precipitação e vento (tempestades) com implicações tanto no comportamento das estruturas de descarga como nas medidas de controle de cheias. Isso deve-se ao aumento de caudal decorrente do aumento da precipitação. Outras implicações são esperadas na estabilidade de quebra-mares e outras obras de proteção, provocadas pelo aumento da tempestade marítimas e subida do nível do mar, já reportadas na costa europeia, que influenciam as condições da zona costeira, nomeadamente o ângulo da onda incidente.
Fig. 1: Problemas recentes com transbordos de rios e tempestades nas áreas costeiras:
a) https://eu.currentargus.com/story/news/2021/07/07/flood-damage-prompts-flood-declaration-eddy-county-commission/7879711002/;
b) https://www.shutterstock.com/pt/image-photo/stormy-sea-big-waves-hitting-breakwater-1232313367
Tem sido noticiado um número de problemas de erosão e poluição em áreas estuarinas e costeiras, bem como descargas excepcionais em barragens, inundações em rios, inundações em áreas urbanas, deslizamentos de terra, movimento de sedimentos e descargas de poluentes. Os efeitos em cascata de alguns desses problemas levam a danos significativos ao meio ambiente que podem ser irreversíveis (por exemplo: as ETARs podem interromper as suas operações por meses devido a enchentes). Vários acidentes podem servir de alerta, estudo e base para estatísticas. Porque é que a engenharia civil não é atraente nos dias de hoje? A sociedade está satisfeita com as infraestruturas de hoje e confia nelas? Muitas despesas com reparos e obras desnecessárias são ineficientes; muitas precisam ser otimizadas, em particular na área de Meio Ambiente, Energia e Segurança, envolvendo a mecânica dos fluidos. Existe legislação que carece de fiscalização e validação. A sociedade está satisfeita com o dinheiro público gasto em reparações?
Para reduzir o valor económico dos projetos de estruturas hidráulicas, permitir uma manutenção e fiscalização eficazes das obras e reduzir os riscos de acidentes com o meio ambiente, o património e a vida em geral, é imprescindível compreender o comportamento dos escoamentos e desenvolver ferramentas fiáveis que permitam a sua previsão em diferentes condições. Pode-se dizer que pouco se sabe sobre o comportamento geral das estruturas hidráulicas existentes e a probabilidade de falha face às condições climáticas. É necessário trabalho de investigação para verificar a sua função e adequação. No entanto, existe tecnologia adequada para resolver os desafios atuais da engenharia, nomeadamente os modelos numéricos, que proporcionaram avanços significativos no conhecimento dos escoamentos turbulentos. Estes modelos permitem a obtenção de perfis detalhados do campo de pressão e velocidade (ver Fig. 2). Além disso, o desenvolvimento de câmaras de alta velocidade e ferramentas de análise de dados, permitiu medições de diferentes variáveis que têm menores frequências de aquisição, e a visualização de fenómenos de difícil visualização pelo olho humano.
Fig. 2: Resultados de simulações numéricas da descarga de fundo da barragem de Foz-Tua.
A Dinâmica de Fluidos Computacional (CFD) deve ser usada para o estudo de escoamentos turbulentos e multifásicos no âmbito da engenharia hidráulica. Estes estudos geralmente envolvem auto-arejamento, ou incorporação de ar, sedimentos suspensos e poluentes. Deve também ser feito um maior uso de métodos e teorias científicas, com base no rigor científico da modelação hidráulica, e ao mesmo tempo promover uma abordagem mais simples, a fim de facilitar a compreensão, o acesso e a participação dos engenheiros e da sociedade em geral sobre o comportamento dos tais fluxos (ver Fig.3).
Fig. 3: Exemplos de simulações numéricas – Dinâmica de Fluidos Computacional.
É necessário manter conhecimentos teóricos, refletindo sobre problemas concretos da engenharia hidráulica, confrontando diferentes áreas e promovendo sinergias e soluções para diversos desafios. Há muito espaço para engenheiros hidráulicos gerirem infraestruturas, para áreas técnicas de projeto e manutenção e para a ciência. Não faltarão desafios interessantes para investigação e esperaremos novas soluções para vivermos melhor, mais seguros e sempre em harmonia com o meio ambiente.
Autora:
Sou a Rita F. Carvalho, Professora do Departamento de Engenharia Civil da Universidade de Coimbra [DEC-FCTUC] na área de Hidráulica, Recursos Hídricos e Ambiente e Investigadora do MARE – Centro de Ciências do Mar e do Ambiente. Licenciei-me em Engenharia Civil em 1991 no DEC-FCTUC; obtive o Mestrado em Hidráulica, Recursos Hídricos no DEC-FCTUC em 1994, o Doutoramento em Ciências da Engenharia na área de Engenharia Civil – Hidráulica, Recursos Hídricos e Ambiente pela Universidade de Coimbra em 2002, e o título de Agregada em Engenharia Civil, especialidade de Hidráulica, Recursos Hídricos e Ambiente pela Universidade de Coimbra em 2020. Desenvolvo atividade de investigação no âmbito da Modelação Física e Computacional de escoamentos na área de Hidráulica de Estruturas associadas à Drenagem Urbana, Fluvial e Marítima, tendo participado em diferentes projetos científicos nacionais e internacionais bem como em trabalhos de consultadoria.
❉ ❉ ❉
Organização:
Email: soapboxscience.lisbon@gmail.com
Em colaboração com:
❉ This article is part of a series of articles prepared by the speakers at the Soapbox Science Lisbon event. The second edition of Soapbox Science Lisbon, to promote women in science, will happen on 23rd of October 2021. Save the date!
The use of numerical simulations as a basis for forecasting and sustainability
By Rita F. Carvalho
In my participation in SoapBox, I will talk about numerical modelling of turbulent flows, as they are the majority of flows in the context of hydraulics and environment. I will show some examples of flows, which are civil engineer work bases in the hydraulics area, how flows are studied and what it is possible to use to study them in greater detail. I will also show the research being carried out in the area of data analysis and multiphysics and finally I will show a procedure that makes it possible, from images, to build calculation meshes, necessary to carry out numerical simulations and obtain results. The idea is to show that there are tools available to properly study the flows and that they should be used to predict situations that allow a better understanding of the flows and thus better adapt the projects, maintenance plans for hydraulic infrastructure. Predict ahead for better security and cost savings. I would also like to point out that although applications relating to civil engineering are shown, this is all multidisciplinary as there are many other fluids and movements that are of interest in other areas.
❉
The environment, heritage and infrastructure existing in today’s society, whose design, maintenance and defence is usually in charge of the civil and the environment engineering, are currently facing different actions and problems (see Fig.1). Climate change is assumed as the future scenario, in the time scale that governs the current concerns, with several consequences on the hydraulic structures. An impact is expected on the frequency of extreme wind and storm events with implication both in the behaviour of the discharge structures and flood control measures. This is due to the increase in flow rates resulting from the increase in precipitation. Another implication is expected in the stability of breakwaters and other protection works, caused by the increase of sea-wave storm and sea level rise already reported in the European coast, which influence the nearshore conditions, namely the angle of incident wave.
Fig. 1: Recent problems with river overflows and storm in coastal areas:
a) https://eu.currentargus.com/story/news/2021/07/07/flood-damage-prompts-flood-declaration-eddy-county-commission/7879711002/;
b) https://www.shutterstock.com/pt/image-photo/stormy-sea-big-waves-hitting-breakwater-1232313367
There has been a reported number of erosion and pollution problems in estuarine and coastal areas, as well as exceptional discharges in dams, overflows in rivers, floods in urban areas, landslides, sediment trails and pollutant discharges. The cascade effects of some of these problems lead to significant damage to the environment which could be irreversible (e.g.: STPs could potentially stop its operation for months due to flooding). Various accidents that occur can serve as a warning, study and basis for statistics. Why is civil engineering not attractive in current days? Is society satisfied by nowadays infrastructures? Do we trust them? Many expenses with unnecessary repairs and works are inefficient; Many need to be optimized in particular in the area of Environment, Energy and Safety, involving fluid mechanics. There is legislation that lacks inspection and validation. Is society satisfied with public money spent on repairs?
In order to reduce the economic value of hydraulic structures projects, enable an effective maintenance and inspection of the works and to reduce risks of accidents with the environment (heritage and life in general) it is essential to understand the flow behaviour and the development of reliable tools that enable its prediction in different conditions. It can be said that little is known about the general behaviour of existing hydraulic structures and the likelihood of failure under climate change conditions. Research is necessary to verify their function and suitability. However, there is suitable technology for resolving current engineering challenges. One, are numerical models that allow obtaining detailed profiles of the pressure and velocity field and this way provide significant advances in the knowledge of turbulent flows (see Fig. 2). Additionally, the development of high-speed cameras and big data analysis tools allows measurements of different variables that have lower acquisition frequencies and the visualisation of phenomena, difficult to distinguish to the human eye.
Fig. 2: Results of Computational Fluid Dynamics simulations of Foz-Tua bottom outlet.
Computational Fluid Dynamics (CFD) should be used to study turbulent and multi-phase flows, within hydraulic engineering. These studies generally involve self-aeration, air entrainment or suspended sediments and pollutants. We can also make a greater use of scientific methods and theories (based on the scientific rigour of hydraulic modelling), and at the same time promote a simpler approach to facilitate the understanding, access and participation of engineers and society in general of the behaviour of such flows (see Fig.3).
Fig. 3: Examples of Computational Fluid Dynamics simulations
It is necessary to maintain theoretical knowledge, reflecting on concrete problems of hydraulic engineering, confronting different areas and promoting synergies and solutions to several challenges. There is plenty of space for hydraulic engineers to manage infrastructures, for technical areas of design and maintenance and for science. There will be no lack of interesting research challenges and we hope that there will be new solutions to live better, safer and always in harmony with the environment.
Author:
I’m Rita F. Carvalho, Professor at the Department of Civil Engineering at the University of Coimbra [DEC-FCTUC] in the area of Hydraulics, Water Resources and Environment and Researcher at MARE – Marine and Environmental Sciences Centre. I graduated in Civil Engineering in 1991 at DEC-FCTUC; I obtained a Master’s Degree in Hydraulics, Water Resources at DEC-FCTUC in 1994, a PhD in Engineering Sciences in the area of Civil Engineering – Hydraulics, Water Resources and Environment at the University of Coimbra in 2002, and the title of Aggregate in Civil Engineering, specialty of Hydraulics, Water Resources and Environment by the University of Coimbra in 2020. I develop research activities in the field of Physical and Computational Flow Modelling in the area of Hydraulics of Structures related with Urban Drainage, Fluvial and Maritime, having participated in different national and international scientific projects as well as in consultancy work.
❉ ❉ ❉
Organizers:
Email: soapboxscience.lisbon@gmail.com
In collaboration with:
Leave a Reply