Os astrónomos descobriram que a composição química de uma estrela pode exercer uma influência inesperada no seu sistema planetário. A descoberta foi possível graças ao levantamento astronómico contínuo SDSS (Sloan Digital Sky Survey) das estrelas observadas pela missão Kepler, da NASA, levantamento que promete levar mais longe o nosso conhecimento sobre a formação e evolução dos planetas extrassolares.

Impacto o teor de ferro de uma estrela nos seus planetas.
Ilustração de como o teor de ferro de uma estrela pode ter impacto nos seus planetas. Uma estrela normal (verde) tem maior probabilidade de hospedar um planeta de período mais longo, enquanto que uma estrela rica em ferro (amarelo) tem mais probabilidade de hospedar um planeta de período mais curto. Créditos: Dana Berry/SkyWorks Digital Inc.; SDSS collaboration.

“Sem as medidas detalhadas e precisas sobre o teor de ferro das estrelas não teríamos feito esta descoberta,” disse Robert Wilson, estudante de Astronomia na Universidade da Virgínia, principal autor do artigo que anuncia os resultados e que foi apresentado, a 9 de janeiro de 2018, no encontro da AAS (American Astronomical Society), em National Harbor, Maryland.

Usando dados do SDSS, a equipa descobriu que as estrelas com maiores concentrações de ferro tendem a hospedar planetas que as orbitam bastante perto – muitas vezes com períodos orbitais inferiores a oito dias; por outro lado, as estrelas com menos ferro tendem a hospedar planetas com períodos mais longos e com órbitas mais distantes. Uma investigação mais aprofundada sobre este efeito pode ajudar a compreender toda uma variedade de sistemas planetários extrassolares na Galáxia, e lançar alguma luz sobre o posicionamento dos planetas nesses sistemas.

A história dos planetas que orbitam estrelas parecidas com o Sol começou em 1995, quando uma equipa de astrónomos descobriu um planeta único a orbitar uma estrela semelhante ao Sol, a 50 anos-luz da Terra. O ritmo das descobertas acelerou em 2009, quando a NASA lançou a missão Kepler, um telescópio espacial projetado para procurar planetas extrassolares. Durante a sua missão primária de quatro anos, o Kepler seguiu milhares de estrelas ao mesmo tempo, observando o ténue escurecimento na luz estelar provocado pela passagem de um planeta em frente à estrela hospedeira. E como o Kepler observou as mesmas estrelas durante anos, viu os seus planetas uma e outra vez, conseguindo assim medir o tempo que cada planeta levava a orbitar a sua estrela. Esta informação revela a distância entre a estrela e o planeta, com os planetas mais próximos a realizarem órbitas mais rápidas que os mais distantes. Graças à monitorização incansável da missão Kepler, o número de exoplanetas com períodos orbitais conhecidos aumentou consideravelmente, de cerca de 400, em 2009, para mais de 3000, hoje.

Embora a missão Kepler tenha sido projetada para detetar planetas extrassolares, não foi idealizada para conhecer as composições químicas das estrelas em torno das quais os planetas orbitam. Este conhecimento deve-se ao levantamento APOGEE (SDSS’s Apache Point Observatory Galactic Evolution Experiment), que estudou centenas de milhares de estrelas em toda a Via Láctea. O APOGEE trabalha recolhendo um espectro para cada estrela – uma medida da quantidade de luz que a estrela emite em diferentes comprimentos de onda. Como os átomos de cada elemento químico interagem com a luz de uma maneira própria, um espectro permite aos astrónomos determinarem não apenas os elementos que uma estrela contém, mas também a sua quantidade – para todos os elementos, incluindo o elemento-chave, o ferro.

“As estrelas como o Sol são essencialmente hidrogénio, mas algumas contêm mais ferro que outras,” disse Johanna Teske, do Carnegie Institution for Science, membro da equipa. “A quantidade de ferro de uma estrela é uma pista importante para sabermos como se formou e também como irá evoluir.”

Combinando dados das duas fontes – órbitas planetárias, da missão Kepler, e química estelar, do APOGEE – os astrónomos ficaram a conhecer as relações entre as estrelas enriquecidas em ferro e os sistemas planetários que as contêm.

“Sabíamos que o enriquecimento de uma estrela em elementos era importante para a sua evolução,” disse Teske, “mas ficamos surpreendidos ao saber que também é importante para a evolução do seu sistema planetário.”

O trabalho apresentado baseia-se em trabalhos anteriores, liderados por Gijs Mulders, da Universidade do Arizona, utilizando uma amostra maior, mas menos precisa, de espectros do projeto LAMOST-Kepler (LAMOST, Large-Area Multi-Object fiber Spectroscopic Telescope, um levantamento do céu chinês). Mulders e a sua equipa descobriram uma tendência equivalente – planetas mais próximos a orbitar estrelas mais ricas em ferro – mas não definiram o período crítico de oito dias.

“É encorajador vermos uma confirmação independente da tendência que encontrámos em 2016,” disse Mulders. “A identificação do período crítico mostra que a missão Kepler continua a dar frutos.”

Segundo Wilson, o que é particularmente surpreendente neste novo resultado é que as estrelas enriquecidas em ferro possuem apenas cerca de 25% mais ferro que as restantes da amostra. “É como usarmos cinco oitavos de uma colher de chá de sal numa receita de bolo que leva meia colher de chá de sal, entre muitos outros ingredientes. Eu ainda comia esse bolo, sem problemas” afirmou ele. “Isto mostra-nos como pequenas diferenças na composição estelar podem ter impactos profundos nos sistemas planetários.”

Mas, mesmo com esta nova descoberta, ainda ficam muitas perguntas sem resposta sobre a formação e evolução dos planetas extrassolares, especialmente planetas do tamanho da Terra ou ligeiramente maiores (superterras). As estrelas ricas em ferro formam intrinsecamente planetas com órbitas mais curtas? Ou os planetas que orbitam estrelas ricas em ferro têm mais tendência a formar-se mais longe migrando depois para órbitas mais próximas? Wilson e a sua equipa esperam trabalhar com outros astrónomos para criar novos modelos de discos protoplanetários e testar estas hipóteses.

“Ainda temos muito a aprender sobre o impacto das composições químicas das estrelas nos seus planetas, em particular, sobre como se formam os pequenos planetas,” disse Teske. “Além disso, o APOGEE fornece mais abundâncias químicas estelares para além do ferro, pelo que haverá provavelmente outras tendências escondidas neste rico conjunto de dados e que ainda não exploramos.”

Fonte da notícia: SDSS

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