Uma equipa internacional de astrónomos descobriu o grupo de galáxias mais distante até ao momento. Este grupo de 3 galáxias, que tem o nome de EGS77, data de uma época em que o Universo tinha apenas 680 milhões de anos, ou seja, menos de 5% da sua idade atual que é de 13,8 mil milhões de anos.

EGS77
Composição de imagens no visível e no infravermelho próximo do Telescópio Espacial Hubble que mostra uma parte da Extended Groth Strip (Faixa Estendida de Groth), uma área bem estudada do céu, localizada entre as constelações da Ursa Maior e de Boieiro. As três galáxias do grupo EGS77, círculos verdes, têm um desvio para o vermelho de 7,7, o que significa que estamos a vê-las como eram quando o Universo tinha apenas 680 milhões de anos. A imagem tem 3,2 minutos de arco. Créditos: NASA, ESA and V. Tilvi (ASU).

As observações mostram que as galáxias estão a participar numa grande transformação cósmica, a chamada reionização. A era começou quando a luz das primeiras estrelas mudou a natureza do hidrogénio no Universo (de uma forma que se pode comparar a um lago congelado a derreter na primavera), transformando o cosmos escuro e opaco naquele que hoje podemos ver.

Animação que mostra a localização de EGS77 na história cósmica, aproximando-se depois das galáxias e ilustrando como a luz ultravioleta das suas estrelas cria bolhas de hidrogénio ionizado à sua volta. Créditos: NASA’s Goddard Space Flight Center.

“O Universo jovem estava cheio de átomos de hidrogénio, que atenuam tanto a luz ultravioleta que nos impedem de ver as galáxias primitivas,” disse James Rhoads, do Goddard Space Flight Center da NASA, em Greenbelt, Maryland, que apresentou as descobertas a 5 de janeiro de 2020 no 235º Encontro da Sociedade de Astronomia Americana, em Honolulu. “EGS77 é o primeiro grupo de galáxias apanhado no ato de limpeza dessa névoa cósmica.”

Já foram observadas galáxias individuais mais longínquas, porém, EGS77 é o grupo de galáxias mais distante observado até ao momento, apresentando os comprimentos de onda específicos da luz ultravioleta longínqua revelada pela reionização. Esta emissão, a que se dá o nome de Lyman-alpha, é dominante em todos os membros do grupo EGS77.

Numa fase inicial, o Universo era um plasma brilhante de partículas, incluindo eletrões, protões, núcleos atómicos e luz. Os átomos ainda não podiam existir. O Universo estava em estado ionizado, tal como o gás nas lâmpadas de néon.

Após cerca de 380 mil anos de expansão e arrefecimento do Universo, os eletrões e os protões combinaram-se formando os primeiros átomos – mais de 90%, átomos de hidrogénio. Centenas de milhões de anos mais tarde, este gás formou as primeiras estrelas e galáxias, mas a sua presença em abundância iria colocar desafios à deteção de galáxias no Universo primitivo.

Os átomos de hidrogénio absorvem e reemitem rapidamente a luz ultravioleta longínqua, conhecida como emissão Lyman-alpha, que tem um comprimento de onda de 121,6 nm. Quando as primeiras estrelas se formaram, parte da luz por elas produzida correspondia a este comprimento de onda. Como a radiação Lyman-alpha interage facilmente com os átomos de hidrogénio, ela não podia viajar para muito longe antes de o gás se dispersar em direções aleatórias.

Visualização que mostra como a luz ultravioleta das primeiras estrelas e galáxias transformou gradualmente o Universo. Os átomos de hidrogénio, também chamados de hidrogénio neutro, dispersam facilmente a luz UV, impedindo-a de viajar para longe. A intensa luz UV das estrelas e galáxias separa gradualmente os átomos de hidrogénio, criando bolhas crescentes de gás ionizado. À medida que essas bolhas crescem e se sobrepõem, a névoa cósmica dissipa-se. Os astrónomos chamam este processo reionização. Aqui, as regiões já ionizadas são azuis e transparentes, as áreas submetidas a ionização são vermelhas e brancas e as regiões de gás neutro são escuras e opacas. Créditos: M. Alvarez, R. Kaehler and T. Abel (2009).

“A luz intensa das galáxias pode ionizar o hidrogénio circundante, formando bolhas que permitem que a luz das estrelas viaje livremente,” disse Vithal Tilvi, investigador da Arizona State University em Tempe. “EGS77 formou uma grande bolha que permite que a sua luz viaje até à Terra sem ser muito atenuada. Bolhas como estas terão eventualmente crescido à volta de todas as galáxias e preenchido o espaço intergaláctico, reionizando o Universo e abrindo caminho para a luz poder viajar através do cosmos.”

EGS77 foi descoberto pela pesquisa Cosmic DAWN (Cosmic Deep And Wide Narrowband), da qual Rhoads é investigador principal. A equipa obteve imagens de uma pequena área na constelação de Boieiro usando um filtro adaptado no NEWFIRM (National Optical Astronomy Observatory’s Extremely Wide-Field InfraRed Imager), que foi anexado ao telescópio Mayall de 4 metros do Observatório Nacional de Kitt Peak, perto de Tucson, Arizona.

EGS77 - pormenor
Ilustração do grupo de galáxias EGS77, que mostra as galáxias cercadas por bolhas sobrepostas de hidrogénio ionizado. Acredita-se que a luz ultravioleta das estrelas, ao transformar átomos de hidrogénio que bloqueiam a luz em gás ionizado, tenha formado estas bolhas em todo o Universo primitivo, que assim foi passando gradualmente de opaco para transparente. Créditos: NASA, ESA and V. Tilvi (ASU).

Como o Universo se está a expandir, a radiação Lyman-alpha de EGS77 foi alongada durante a sua viagem, e os astrónomos detetam-na em comprimentos de onda do infravermelho próximo. Não podemos ver estas galáxias em luz visível, porque essa luz começou em comprimentos de onda mais curtos que o da radiação de Lyman-alpha e foi dispersada pela névoa de átomos de hidrogénio.

Para ajudar na seleção de candidatos distantes, os investigadores compararam as suas imagens com outros dados disponíveis para a mesma região, obtidos pelos telescópios espaciais Hubble e Spitzer. As galáxias que surgiam brilhantes em imagens no infravermelho próximo foram identificadas como possíveis candidatos, as que surgiam em luz visível foram rejeitadas por estarem muito próximas.

A equipa confirmou as distâncias das galáxias de EGS77 usando o espectrómetro MOSFIRE (Multi-Object Spectrometer for Infra-Red Exploration) do telescópio Keck I, no Observatório W. M. Keck em Mauna Kea, Havai. As três galáxias mostram linhas de emissão Lyman-alpha em comprimentos de onda ligeiramente diferentes, o que indica distâncias ligeiramente diferentes. A separação entre as galáxias adjacentes é de cerca de 2,3 milhões de anos-luz, um pouco menor que a distância entre a galáxia de Andrómeda e a Via Láctea.

“Este é o primeiro grupo de galáxias identificado como responsável pela reionização cósmica, mas as futuras missões da NASA irão ter muito mais para revelar,” disse Sangeeta Malhotra, do Goddard, coautora do estudo. “O próximo Telescópio Espacial James Webb é sensível à emissão Lyman-alpha de galáxias ainda mais fracas a estas distâncias e poderá vir a descobrir mais galáxias no grupo EGS77.”

Os astrónomos acreditam que outras bolhas de reionização semelhantes, desta época, sejam raras e difíceis de encontrar. O telescópio WFIRST (Wide Field Infrared Survey Telescope) previsto pela NASA pode ser capaz de descobrir outros exemplos, dando ainda mais luz a esta importante transição na história cósmica.

O artigo que descreve estes resultados será publicado na revista The Astrophysical Journal.

Fonte da notícia: NASA

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