A Grande Nuvem de Magalhães (LMC – Large Magellanic Cloud) é um lugar quimicamente primitivo.

Ao contrário da Via Láctea, esta galáxia anã com algumas dezenas de milhares de milhões de estrelas não tem abundância de elementos pesados, como carbono, oxigénio e azoto, pelo que os astrónomos previam que a LMC deveria conter uma quantidade insignificante de moléculas complexas à base de carbono, em comparação com a nossa galáxia. As observações anteriores pareciam apoiar esta previsão.

Moléculas orgânicas complexas na Grande Nuvem de Magalhães.
A imagem do infravermelho distante (à esquerda) mostra a totalidade da Grande Nuvem de Magalhães. O zoom mostra a região de formação de estrelas observada pelo ALMA. Combinação de dados de infravermelho médio do Spitzer e dados do visível (H-alfa) do telescópio Blanco de 4 metros. Crédito: NRAO/AUI/NSF; ALMA (ESO/NAOJ/NRAO); Herschel/ESA; NASA/JPL-Caltech; NOAO.

No entanto, há novas observações realizadas com o ALMA (Atacama Large Millimeter/Submillimeter Array) que revelam assinaturas químicas surpreendentemente claras de moléculas orgânicas complexas, como metanol, dimetil éter e metanoato de metila. Embora tivessem sido encontrados vestígios de metanol na LMC em observações anteriores, as duas últimas moléculas foram descobertas pela primeira vez e são as mais complexas detetadas fora de nossa galáxia.

Os astrónomos descobriram o “brilho” fraco e em comprimentos de onda milimétricos das moléculas a sair de dois embriões densos de formação de estrelas da LMC, regiões conhecidas como “núcleos quentes”. Estas observações podem fornecer informações sobre a formação de moléculas orgânicas complexas no início da história de o Universo.

“Embora a Grande Nuvem de Magalhães seja uma das galáxias mais próximas de nós, esperamos que ela partilhe algumas semelhanças químicas mais estranhas com as galáxias distantes e jovens do Universo primordial,” disse Marta Sewiło, astrónoma do Centro de Voo Espacial Goddard da NASA, em Greenbelt, Maryland, e principal autora do artigo sobre esta descoberta publicado na revista Astrophysical Journal Letters.

Os astrónomos referem-se à falta de elementos pesados como “baixa metalicidade”. São necessárias várias gerações de estrelas, com nascimentos e mortes sucessivos, para que uma galáxia fique com elementos pesados, que nas futuras gerações estelares se tornam os blocos de construção de novos planetas.

“As galáxias jovens e primitivas não tiveram tempo suficiente para se tornarem tão quimicamente enriquecidas,” disse Sewiło. “As galáxias anãs, como a LMC, mantiveram provavelmente este mesmo aspeto jovem devido às massas relativamente baixas, que reduzem severamente o ritmo da formação estelar.”

“Devido à baixa metalicidade, a LMC abre-nos uma janela para essas primeiras galáxias adolescentes,” observou Remy Indebetouw, astrónomo do NRAO (Observatório Nacional de Radioastronomia) em Charlottesville, Virgínia, e coautor do artigo. “Os estudos de formação de estrelas desta galáxia vão ajudar-nos a entender a formação estelar no Universo primordial.”

Os astrónomos concentraram o seu estudo na região de formação de estrelas N113, que é uma das mais ricas em gás. Observações anteriores desta área, realizadas com o Telescópio Espacial Spitzer da NASA e com o Observatório Espacial Herschel da ESA, revelaram uma surpreendente concentração de objetos estelares jovens – protoestrelas – que começaram a aquecer os seus berçários estelares, fazendo-os brilhar intensamente em luz infravermelha. Pelo menos uma parte dessa formação estelar deve-se a um efeito de dominó, com a formação de estrelas maciças a desencadear a formação de outras estrelas na vizinhança.

Sewiło e a sua equipa usaram o ALMA para estudar vários novos objetos estelares nesta região tentando compreender melhor a sua química e a sua dinâmica. Os dados do ALMA revelaram surpreendentemente as assinaturas espectrais de dimetil éter e metanoato de metila, moléculas que até agora nunca foram detetadas tão longe da Terra.

As moléculas orgânicas complexas, com seis ou mais átomos, incluindo o carbono, são alguns dos blocos básicos de construção das moléculas essenciais para a vida na Terra, e provavelmente noutras partes do Universo. Embora o metanol seja um composto relativamente simples em comparação com outras moléculas orgânicas, é, no entanto, essencial para a formação de moléculas orgânicas mais complexas, como as que o ALMA observou recentemente.

Se estas moléculas complexas se podem formar facilmente em torno de protoestrelas, é provável que elas persistam e se tornem parte dos discos protoplanetários de jovens sistemas estelares. Tais moléculas foram provavelmente transportadas para a Terra primitiva por cometas e meteoritos, ajudando a impulsionar o desenvolvimento da vida no nosso planeta.

Os astrónomos consideram que, uma vez que as moléculas orgânicas complexas se podem formar em ambientes quimicamente primitivos como a Grande Nuvem de Magalhães, é possível que a estrutura química para a vida possa ter surgido relativamente cedo na história do Universo.

Fonte na notícia: NRAO

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